Relatar a si mesma: estaria a ADI 4275 fundamentada em teorias (trans)feministas?
Feminismo e Direito: produção acadêmica sobre gênero, violência, participação política e sexualidades e(m) decisões do STF. Organização: Carmen Hein de Campos; Salete Maria da Silva. Lumen Juris: Rio de Janero, 2024.
Trabalhamos com a hipótese de que o núcleo argumentativo dos votos dos Ministros na ADI 4275 está embasado em uma dinâmica permissiva de modernização da sexualidade ocidental, que avança os sentidos das liberdades privadas, de tradição liberal, para situações antes reprimidas e rechaçadas. Essa luta pela autodeterminação das pessoas trans demanda do direito a liberação em relação aos mecanismos sócio-biológicos que conduzem as possibilidades de registro civil, enquanto uma fase inicial de uma luta mais ampla e complexa por cidadania e autonomia. Investigamos, por meio de análise de discurso, se há citações de argumentos feministas (e até transfeministas) e se as citações, caso existentes, seriam desenvolvidas criticamente. Para essa coleta de dados documentais relacionados com o nosso recorte analítico — citações de teorias específicas de gênero e sexualidade e suas incorporações críticas —, restringiremo-nos aos votos dos Ministros no Acórdão da ADI e aos argumentos encontrados nas anteriores peças processuais que dão sustentação ao debate feito pelos Ministros. Para a análise, dividimos o capítulo em dois momentos: no primeiro, descrevemos o modo como a primeira fase da modernidade jurídica brasileira proíbe a autodeterminação de identidade de gênero das pessoas trans com argumentos sociológicos e biologizantes; e, no segundo, analisamos, por meio de categorias analíticas que expressam esse sentido de liberdades privadas da tradição liberal, os discursos presentes na decisão da ADI 4275.